Quais são os principais desafios ao 5G?
O 5G surge em várias etapas e os desafios também se apresentam de uma forma gradual. Por isso, dizemos, que estamos a preparar o 5G há bastante tempo. O hardware que garante hoje o serviço de 3G e 4G é a mesma geração que de equipamento que vai amanhã garantir o 5G. Ou seja, este é um processo evolutivo que implica, naturalmente, ir modernizando progressivamente todas as estações para que tenham um harware compatível com todas as tecnologias envolvidas no 5G para que, mediante uma atualização de software, se consiga fazer o enabler do 5G. Esse é o processo que está a ser feito e o estado da tecnologia está a ficar maduro…
Mas esta virtualização das redes…
Estou só ainda a falar da componente de rádio. Depois o que acontece é que a forma de escalar a rede que suporta o 5G na sua infraestrutura remanescente – isto é muito mais do que só a antena – passa por um upgrade que só é viável economicamente se assentar em tecnologias como, por exemplo, a virtualização. E isso (a virtualização) é um enabler fundamental para que a arquitetura de uma rede 5G escale para o futuro. Este é, claramente, um desafio… porque traz dificuldades novas.
E estas etapas são dependentes umas das outras? Ou é possível ir avançando com alguns processos até se dá a transição para um, chamemos-lhe… “5G puro”?
Sim, é possível ter processos correr em paralelo. Aliás, é por isso que o 5G vai surgir na versão non-stand alone (NSA). Esta foi a forma que a indústria encontrou de conseguir arrancar o 5G ainda em cima de uma arquitetura 4G. Ou seja, ele é non-stand alone porque depende da infraestrutura do 4G. Só funciona, mesmo, ligada a uma antena 4G e a essa infraestrutura. Isto abre caminho para a arquitetura stand alone, em paralelo, na qual o 5G vai funcionar de forma totalmente autónoma.
Isso acontece em 2021?
Os standards devem ficar fechados em meados de 2020 e só no final desse ano e 2021 é que se verão, acredito, implementações comerciais com essa arquitetura. Por que é ela que vai permitir tirar proveito daquilo que ouvimos falar sobre o 5G: as velocidades muito mais elevadas, as latências mais baixas… por isso, é que se diz que os use cases mais importantes na indústria automóvel ou na medicina surja mais tarde… esses vão mesmo precisar desta rede 5G stand alone. É aqui que entram outros conceitos como o slicing (a tecnologia que permite ao operador atribuir partes da rede a utilizações com necessidades específicas) …
A virtualização acaba por ser um fator económico que permite manter o negócio sustentável…
O que hoje acontece, ainda nas redes atuais, é que a parte core assenta ainda em cima de servidores e de hardware que é dedicado. O que está a acontecer agora é um movimento, no qual se está a transformar aquilo que eram as centrais dos operadores de telecomunicações… em data centers. Na prática é um data center de IT. Isto permite usar as infraestruturas standard fornecidas pelos fabricantes habituais que fornecem esses ecossistemas e, por cima, é que corre o software do 5G. Aí ganha-se escala porque é mais viável economicamente ter esses servidores. Além disso, aumentamos o poder de computação para depois endereçar as necessidades. É por isso que a virtualização é um pilar fundamental e implica vários processos de aprendizagem. Aliás, nós já temos hoje funções virtualizadas rede 4G
Já estão a aprender
Exato. Tal como comecei por referir que no rádio para o 5G fomos modernizando a rede para perceber e podermos preparar-nos para o que aí vem.
O público em geral tem muito a preocupação da disponibilização dos equipamentos que vão suportar a rede 5G quando, na realidade, é a montante que a transformação tecnológica é mais crítica do que na disponibilização dos smartphones…
É verdade. Os terminais também são um ponto crítico. Mas já vimos, até em feiras internacionais, que os dispositivos estão prontos – aliás, em junho, os fabricantes vão ter os equipamentos já no mercado.
E a Vodafone, a nível mundial, está a participar em vários projetos de implementação desta geração de comunicação – de fase intermédia?
Sim, a Vodafone participa em projetos nos quatro principais mercados. Uma questão que tem a ver com a importância desses mercados, mas, também, com disponibilização do espectro. Há vários países onde a questão do espectro já está clarificada e, portanto, já estão a preparar este ano, e durante o próximo, o lançamento de produtos comerciais em 5G.
E é lógico que exista uma partilha de conhecimento dentro da Vodafone…
Essa é a grande vantagem que nós temos porque há uma grande partilha das melhores práticas. Quer na vertente tecnológica, quer, também, na experiência dos casos de estudo e no trabalho com os vários setores de mercado que se acredita vão tirar muito partido do 5G.
E a Vodafone criou em Portugal o 5G Hub (centro para o desenvolvimento de projetos na área do 5G) e vai disponibilizar duas estações 5G que vão estar em duas universidades portuguesas. Também vão levar estes sistemas a polos empresariais?
Temos neste momento uma estação aqui. É uma rede de testes. E vamos ter esta arquitetura na Universidade de Engenharia do Porto e também nos Instituto Superior Técnico. Celebrámos um protocolo com ambas as instituições e estamos em conversações com mais duas universidades. Queremos ter uma representatividade a nível nacional que seja importante. Acreditamos que com estes protocolos isso vai ser possível. Qual é o propósito? Na fase em que estamos – que é a de aprender a tecnologia – queremos trazer para este grupo pessoas que estejam na crista da onda e que estejam numa área de exploração de ideias e conceitos…
Para criar conhecimento…
Sim. Esse é um dos maiores propósitos do 5G Hub: fomentar este ecossistema em torno do 5G Hub. É por isso também que ligamos aqui a componente das startups. Temos algumas destas empresas que já estamos a trabalhar e que vão utilizar a antena que já temos no edifício. São as condições ideais para testar a tecnologia em funcionamento. E, claro, criar os casos que vão servir para futuras implementações.
Com esta polémica que rodeia a Huawei (a questão comercial entre os EUA e a China)… como é que está a vossa relação com essa empresa?
O nosso parceiro estratégico para o 5G é a Ericsson. Nas restantes tecnologias e em todo o ecossistema, trabalhamos a totalidade dos parceiros.
O facto de continuar a existir alguma demora na atribuição das licenças (e das frequências) por parte da ANACOM; e agora com larguras de banda muito maiores e com pagamentos que são proporcionais à banda… Que comentário fazem a estes dois pontos tão importantes para a concretização comercial do 5G…
É fundamental que exista um equilíbrio para garantir que somos competitivos. Acreditamos que o modelo (banda/valor) deve ser revisitado por forma a garantir que exista um modelo de negócio que seja equilibrado e sustentável neste ecossistema. Nesse sentido, não estamos preocupados porque estamos convencidos que o regulador vai garantir as condições necessárias para que estejamos dentro dos timings que estão, de certa forma, ditados pela Agenda Digital da União Europeia que estipula que deverá existir um lançamento em 2020 nos vários estados-membro da União.
Bem, mas para isso, parece-me que o ecossistema já devia estar um pouco mais maduro.
Não temos nenhuma informação oficial de como está esse processo. Há um conjunto de decisões que têm de ser tomadas pelo regulador para clarificar as bandas que vão estar disponíveis para leilão. Houve uma consulta pública que foi efetuada no final do ano passado (feita pelo regulador a todos os intervenientes); neste momento o regulador está a processar essa informação e a garantir que o espectro necessário vai estar disponível.
De facto, olhando para toda a Europa… Portugal parece estar atrasado em relação a todos os outros. Mas acredito que vai existir uma aceleração nesse sentido para garantir que em 2020 vamos ter os primeiros lançamentos.
Está a criar-se no mercado (e nos consumidores) uma grande expetativa em relação ao 5G. Como se existisse nas nossas vidas um momento antes e depois do 5G. Mas na realidade esta é uma transição que vai demorar algum tempo. Certo?
Não há nenhum interruptor 5G que vamos carregar e amanhã temos o 5G… e o mundo é diferente. Não vai ser assim. É um pouco há semelhança do que acontece com outras tecnologias. Tudo isto são pequenos passos progressivos – por isso é fundamental fazer todo este percurso para garantir que a rede vai estar progressivamente melhor e preparada para endereçar todas as áreas de negócio.
Mas isso é um período que vai demorar quantos anos? Dois? Três?
Três anos será o período necessário para endereçar novas áreas que vão ser criadas – (como as áreas da Saúde e da Mobilidade Inteligente).
Algo que não depende só dos operadores…
Exato. Há todo um ecossistema que não depende dos operadores. Por exemplo, para os automóveis autónomos é necessário garantir que há um quadro legal vigente que permita que estes veículos transitem… tal como vai ser preciso que as seguradoras já tenham este ecossistema previsto. É apenas um exemplo, mas mostra que os operadores podem estar tecnicamente preparados, mas as áreas de negócio mais avançadas que vão surgir trazem com elas outros desafios.
Faz todo o sentido…
O 5G não é um jogo que vá ser jogado de forma individual por ninguém. É um jogo de equipa. É todo um ecossistema de parceiros que tem de estar a trabalhar em conjunto para que o 5G aconteça. Por isso é que não é tão rápido quanto possamos pensar.