Renato Panda e Ricardo Malheiro podem não ser músicos, mas ficaram em posição privilegiada para conhecer alguns dos segredos mais bem guardados de uma música: durante os trabalhos relacionados com as teses de doutoramento, os dois investigadores da Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade de Coimbra (FCTUC) desenvolveram uma ferramenta que permite conhecer o estado emocional evocado por um tema musical e respetiva letra. A nova ferramenta poderá revelar-se especialmente útil nos videojogos, publicidade ou produção de filmes.
«Genericamente, estamos perante um sistema informático bimodal inovador que junta informação textual e acústica, obtida através de tecnologias de inteligência artificial, machine learning, processamento de sinal áudio e processamento de linguagem natural, para classificar as músicas com base no seu conteúdo emocional, ou seja, detetar e entender as emoções contidas na música», explica a FCTUC em comunicado.
A investigação teve por referência o denominado modelo circumplexo da emoção de Russell. Este modelo pretende analisar conteúdos do ponto de vista psicológico através de um eixo horizontal, ou da valência, que está relacionado com o tipo de emoção, seja ela positiva ou negativa; e o eixo vertical, ou da ativação, que remete para a análise da energia presente na música.
«Em seguida, para testar e validar a eficácia desta abordagem no reconhecimento de emoções, foi construída uma base de dados pública (disponível em mir.dei.uc.pt, que pode e deve ser usada por outros investigadores da área) contendo 900 músicas. Os algoritmos inteligentes desenvolvidos mapearam as músicas e classificaram as emoções presentes em cada uma delas», explica o comunicado da FCTUC.
Durante o projeto que foi apoiado pela Fundação para Ciência e Tecnologia (FCT), Renato Panda desenvolveu a análise dos temas musicais tendo em conta oito dimensões: melodia, harmonia, ritmo, dinâmica, tom, expressividade, textura e forma musical. A Ricardo Malheiro calhou a missão de fazer análise das letras das canções, com técnicas de processamento de linguagem natural e distinção de estilos. De acordo com os investigadores foi possível estabelecer relações entre letras e as emoções expressas por uma melodia – o que permite apurar se uma música é «triste, romântica ou alegre», recorda o comunicado da FCTUC.
Rui Pedro Paiva admite que o mercado poderá receber com agrado a nova ferramenta, mas lembra que ainda terão de ser feitos aperfeiçoamentos antes de uma hipotética estreia comercial. «Queremos realizar mais testes e explorar outras possibilidades como, por exemplo, avaliar a variação das emoções ao longo de uma música», conclui o professor da FCTUC.